quinta-feira, 26 de abril de 2012

Crítica: Ensaio Sobre A Repetição, por Guilherme Nervo



A Dança das Garrafas de Vidro

            Ensaio Sobre a Repetição inicia com uma partitura corporal que as duas atrizes repetem com algumas modificações. O cenário revela um quadrado do tamanho do palco com garrafas verdes de vidro. Sofia Vilasboas entra em cena revelando um corredor iluminado por uma luz vermelha. Ela bebe o conteúdo de algumas garrafas e sai. Carolina Pommer entra em cena com um corpo mais decidido, como uma lança pronta para ser fincada na plateia. Ela lê o bilhete na garrafa, ri, bebe e sai. Não há qualquer personagem em cena e eles nem aparecerão. O que está em questão é a performance. A sonoplastia de Rodrigo Pereira conjuga tambor, faluta e pratos; assim como um metrônomo, é a trilha sonora que rege o movimento das atrizes. A escolha da sonoplastia feita ao vivo foi muito feliz e gerou excelentes resultados.
Quem é você?
Eu não sei, eu não me lembro.
Não abra a porta! O corredor está cheio de sonhos difíceis.
            Pode ser paradoxal, mas toda a energia apresentada no corpo de Carolina, não está em sua voz, que soa arranhada. O que não acontece com Sofia, que apresenta uma voz agradável e com nuances. O figurino não tem pretensões, elas usam uma blusa e saia. O que não significa que elas representem apenas mulheres, me parece, inclusive, que centenas de homens, mulheres e crianças passam pelos seus corpos, às vezes numa fração de segundo.
            Ao querer definir “repetição” o espetáculo se torna didático, mas logo essa atmosfera é rompida com os exemplos lúdicos como levar guarda-chuva em dia de sol, tomar café com cigarro, ver a novela das cinco, das seis, das sete, das oito e das nove, ficar paralisado, tentar se separar dez vezes do mesmo namorado. A questão é lançada: por que repetimos atos dolorosos infinitamente se eles não nos proporcionam prazer?
            Duas histórias são contadas utilizando-se da metáfora. Garrafas de leite azedo espalhadas pela casa demarcam brigas consumadas, bilhetes de despedida em todos os lugares da casa demarcam o esforço que requer uma despedida definitiva. Chega então a primeira interação com a plateia, as luzes acendem e as perguntas são lançadas: como foi seu dia, por que você usa esse corte de cabelo, quantas vezes você disse bom dia hoje?
            HOJE eu saí de casa...
            Chega então o momento da melhor partitura da peça, as atrizes narram ações físicas enquanto seu corpo (ou o da outra) as ilustra. Há dinâmica, atmosfera e equilíbrio. Várias imagens passam pela nossa cabeça, enquanto o ritmo aumenta até alcançar um frenesi. O auge do espetáculo acontece aqui, quando Sofia dança através das garrafas espalhadas (com as mãos e pés colados no chão) enquanto responde ao interrogatório de Carolina. Há poesia e verdade nessa cena, sem faltar comicidade. Mas o interrogatório vai ficando cada vez mais ácido até perguntar a ela se é o tipo de mulher que vai pra cama na primeira noite.
Profissão? Atriz. Profissão? Atriz! Profissão? Psicóloga!
Você demonstra suas carências?
            Sofia grita sim! sim! sim! até desmoronar no chão. As garrafas caem, algumas quebram. É a vez de Carolina dar uma aula de etiqueta feminina. O que parece ser desmentido pela forma como ela bebe o conteúdo da garrafa logo depois de terminar de falar. Agora as atrizes começam a narrar frustrações amorosas como namoros à distância, mudança de cidade, despedidas. É possível perceber os recortes de textos de Fernando Pessoa, Gabriel García Marquez e Sarah Kane. Falta a construção de uma personagem? Talvez sim, mas nem tanto. Essa necessidade vem e vai, é mutante. O espetáculo se faz sem personagens, não há dúvida.
            Uma das atrizes decide que o melhor a ser feito é uma reconciliação, portanto ela junta todas as garrafas no centro, como quem está decidido de que agora o amor vai dar certo. Ilusão. Não, eu não te amo. Pode ficar com as tuas coisas. O que resta é ler o poema da garrafa.
Ainda que se mova o trem, tu não te moves de ti.
            A última cena é linda, a areia despejada entra na garrafa do meio enquanto faz marcas circulares no chão. Vem a sensação de estar no mar e na areia, na grama e no barro, no asfalto quente e no assoalho frio. Uma última coisa deve ser dita: Ensaio Sobre a Repetiçãomerece mais do que quarenta minutos.
Um brinde!

*Guilherme Nervo é estudante do Departamento de Arte Dramática da UFRGS e já possui um blog de críticas teatrais: http://percebeoteatro.blogspot.com.br/

domingo, 22 de abril de 2012

Efêmera Arte: Ensaio Sobre a Repetição


Matéria da TV UFRGS sobre o espetáculo do mês de ABRIL do TPE: Ensaio Sobre A Repetição.

Não perca as últimas apresentações na QUARTA-FEIRA, dia 25/04, às 12h30 e 19h30.